É engraçado como as coisas aconteceram pra mim. Durante anos eu fui uma pessoa amorosamente muito fechada. Sempre fui muito carinhoso, desde criança, mas durante um bom período que abrange desde o fim da minha adolescência até um certo ponto de 2001 eu não me apaioxnei, não me envolvi, não exercitei o meu amor, além do fraternal. A minha capacidade amorosa foi deixada de lado, por mim, nem sei como.
Em 2002 me apaixonei como, acho eu, nunca antes. Por uma pessoa normal — virginiana ;) —, cheia dos seus probleminhas e, naquele momento, absolutamente encantadora. Foi forte, intenso, verdadeiro, tudo isso pra mim, mas insustentável. Por motivos agora irrelevantes essa pessoa não me bancava — nem poderia, acho eu, se nem eu mesmo era capaz, tamanha a feiura com que pintei meu íntimo. Olhando hoje, consigo ver que se eu não tivesse passado por isso e pela dor decorrente, talvez eu jamais tivesse conseguido escavar em mim tudo o que escavei, tudo o que me prendia, tudo o que eu estupidamente considerava indigno. Enfim, tudo o que minava meu amor-próprio, minha auto-estima e me impedia de entrar em contato comigo mesmo e não com o reflexo que eu via no espelho, tornando, portanto, minha busca tão vã.
Fico pensando na força que foi necessária para romper tamanha couraça que eu havia erguido durante e através de tanto tempo e creio que essa força partiu de mim, desde o começo, como uma pressão embrionária que, não cabendo mais em seu ovo, rompe a casca, transcende o útero e nasce, dolorosamente, erguendo seu choro à luz do dia. Doeu, e a dor sempre dói mais em quem a sente. Doeu tanto que durante muito tempo era a dor a única coisa visível na minha frente.
Mas o que o tempo levanta soçobra ao sabor desse mesmo senhor. E se não fosse você — que uma hora ou outra vai ler isso aqui — a me gerar tamanho impulso, eu poderia muito bem estar ainda dentro de um ovo, embrionário, estacionário, perdido em mim mesmo. Faltou agradecer. Talvez o devesse às mãos do destino, mas não foi o destino aquele a quem amei, não foi esse velho e frio senhor que detonou em mim a chama que consumiu a velha Fênix, não foi ele o obstáculo que inspirou mudanças. Cruzando nossos caminhos, deu-me a chance de crescer. E eu, desajeitadamente como todo novo (ser) amante, a agarrei.
Então, agradeço a você, como destino manifesto, por ter entrado em minha vida e me feito alquebrar, por mais que não quisesse — eu sei disso muito bem. Trago comigo lições valiosas que nem você (nem ninguém!) sabe que me ensinou. Guardo-as em uma gaveta especial. E só posso desejar o mesmo para quem, de certa forma, já amei mais do que a mim mesmo e me fez, assim, ver o quão mais poderia me amar.
É isso — nessa reflexão que só um dia chuvoso poderia promover —, faltava agradecer: obrigado (do fundo do meu coração), gato.