Jardim das delícias
Mais do que um recurso paisagístico, a poda é, muitas vezes, necessária para que a planta possa crescer mais forte. Não se trata apenas de cortar galhos e ramos, mas de aliviar a planta de membros doentes ou que não dão mais frutos e folhas nem produzem seiva elaborada necessários para o seu desenvolvimento, mas que consomem energia, pois fazem parte das ramificações alimentadas pela planta.
Podada e mais leve, a planta pode gerar novos brotos, ramos mais fortes, folhas mais verdes, flores e frutos cujas sementes têm mais chance de germinar, e crescer, e verdejar, e florescer, e germinar...
Eu estou em poda. Calmamente tenho olhado para os meus ramos — os galhos que eu mesmo fiz crescer, estirei e desmembrei para alcançar outrem — e cuidadosamente separado os que de fato alcançam o sol dos que crescem inutilmente para a sombra. Não é o caso de uma poda sumária ou da egoísta tentativa de me transformar em um bonsai, fechado, confinado em meu vasinho. Trata-se de respeitar a força de minhas raízes e o alimento de meu solo. Trata-se, na realidade, de exercitar um amor maduro como um fruto, para mim e para os outros que terão mais espaço e liberdade para os seus próprios galhos. Podar é, essencialmente, amar: cuidar, escolher, cortar, fortalecer, estreitar.
Dos ramos extirpados, faço mudas e as dou para quem quiser levar. Que elas cresçam fortes e belas, frutos de um esforço meu outrora depositado. Ou não. O meu jardim não tem cercas, telas ou arame farpado. Qualquer semente ou broto pode, de bom grado, germinar e dar ramos e flores — que serão, como sempre foram, bem cuidadas e extremamente amadas. Mas há a poda, pelo mesmo motivo que há o jardim, porque há em mim muito sol, assim como a noite. E há momentos em que o jardim precisa de cuidado extra, de ser visitado, lembrado, admirado, polinizado. E nessas horas, quem aqui plantou a semente, orgulhou-se do broto, colheu do fruto ou se alegrou da flor deve cuidar, pois o fruto acaba e a semente só germina se plantada, murcha a flor.
Um jardim deve ser uma alegre demonstração de vida: dinâmico, repleto de cores, cheiros, sons e, sim, amores. O triunfo, sobre a aridez entrópica, da estreita flor.