— Bella voce! — disse o maestro.
Ponto pra mim e pra minha barba de Pavarotti — só a barba por enquanto.
Foi a via crucis mais apropriada que um Messias já viu. Tanto que eu, que cheguei atrasado (e desesperado, obviamente), cheguei primeiro, antes do maestro, do outro solista e 90% da orquestra, todos pra lá de atrasados. Eu digo o seguinte: o CEU São Mateus deveria se chamar CEU Se Meteu, lá onde Judas perdeu o juízo.
Pra eu pagar a minha língua, foi o público mais educado que eu já vi — pra constrastar com o do CEU Parque São Carlos. Donde se deduz que educação não depende de credo, cor, raça, classe social, longitude ou latitude e atrai seus afins.
Mas o ponto alto mesmo foi o bebê no colo da mãe que estava bem de frente pro maestro e imitava, feliz da vida (mas sem dar um pio), os gestos da regência.
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Podem me chamar de Rosa-dos-Ventos. Acompanhem meu sábado: 7h30 – arcordar, banho, café da manhã, sair; 9h00 – Tendal da Lapa (quase Lapa de baixo), ensaio, um sanduíche e aula; 15h00 – Granja Julieta (Santo Amaro), aula; 16h20 – casa, tomar banho, vestir o terno, tomar um suco, comer uma maçã, vocalises; 17h20 – sair (de carro, veja bem); 18h50 – CEU São Mateus (1h30 depois, entendeu?); 22h00 – Vila Mariana, dois chopps, um aniversário e a segunda refeição decente do dia; 23h40 – Horto Florestal; 0h20 – Lar, doce lar, duas aspirinas, cama e uma ameaça de morte a quem ousasse me acordar.
Já os amigos comiam feijoada. Mas músico é que tem vida boa — claro, e levar a vida na flauta é uma expressão que só me inspira uma interpretação, sem vaselina.
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Meu domingo alegre vai ser. Sabe o que eu vou fazer hoje? Nada que exija compromisso, estudo ou empenho. Talvez sair e dançar como se hoje ainda fosse sábado. Decreto meu dia de férias! Vou comprar uma flor bem bonita pra mim e colocar no criado mudo, ou na minha mesa — como uma vela acesa, à guisa de oração. Porque além de tudo eu mereço e quero também ganhar flores nesta vida.
Sim, eu ainda acredito. Mas ter fé no milagre só não basta, é preciso corpo e alma.