O chefe do departamento do Conselho Pontifício para a Família, do Vaticano, Gianfranco Grieco, afirmou que a decisão da Arquidiocese de Olinda e Recife de excomungar os responsáveis pelo aborto da menina de 9 anos — violentada em Alagoinha (a 230 km de Recife) — foi correta. A declaração foi publicada nesta sexta-feira pelo jornal italiano “Corriere della Sierra”. (Folha)
Aconteceu o que eu temia. Esta foi a semana dos absurdos — deve ser o calor, sabe; eu tô delirando. Tinha, né? Tinha que ser a Igreja Católica. Tinha que ir alguém lá e excomungar quem tá tentando salvar a vida de uma menina de 9 anos, que estava grávida de gêmeos e corria risco de vida porque foi estuprada pelo padrasto, de 23, que também estrupou a irmã dela, de 14, portadora de deficiências física e mental, e que as assedia há 3 anos. Eu não consigo imaginar um quadro mais dantesco.
“É muito, muito delicado, mas a Igreja nunca pode trair o seu anúncio, que é defender a vida desde a concepção até à morte natural, mesmo em face de um drama humano tão forte como o da violência de uma criança”, disse Grieco. (Folha)
Ah, não?! Que engraçado, eu jurava que foi essa mesma Igreja que bancou a dita Santa Inquisição, que condenou o sistema heliocêntrico, ameaçou e prendeu Galileu — um cristão fervoroso — e que queimou Giordano Bruno na fogueira, tudo em prol da “verdade teológica”. Que mais? Olha que a lista é vasta! Quer dizer que aborto em casos hediondos não pode, mas tacar fogo pode? Hipocrisia não é pecado?
Eu não sei excomunhão condena alguém ao inferno — considerando que essa pessoa acredite no inferno, claro —, mas eu espero que não. Já pensou, depois de tudo isso, ainda por cima ir parar no inferno e dar de cara com essa corja? Esconjuro!
+
Um update. Ah, desculpa, mas não vai dar!
Ela comentou comigo, de bate-pronto: quer dizer que excomungar mãe e médicos (preocupados com a vida da menina, num sentido muito maior do que apenas a sobrevivência a uma gravidez de altíssimo risco) pode, mas excomungar um extuprador não pode?
Ontem, dom José declarou à reportagem que o aborto é mais grave que o estupro, e por isso a Igreja Católica condena o primeiro caso com a excomunhão automática. (…) “Católico que é católico aceita a lei da igreja. Quem não aceita é católico mais ou menos, e isso não existe”, disse. Para os médicos, a continuidade da gestação de gêmeos poderia ser fatal à menina, que pesa cerca de 30 quilos. (Folha)
Claro. Esse realmente é um argumento de peso. Pena que seja hipócrita, desumano, impiedoso e tão cristão quanto um tijolo.
“Tenho pena do nosso arcebispo, que não conseguiu ser misericordioso com o sofrimento de uma criança inocente, desnutrida, franzina, em risco de vida, que sofre violência desde os seus seis anos.” (Rivaldo Mendes de Albuquerque, 51, médico, católico praticante)
Pois é. Um excomungado é muito mais cristão do que um punhado de bispos. Será que é preciso dizer mais alguma coisa?
A igreja católica não é exatamente cristã, no que diz respeito a uma vida crística. Só usa o mito Cristo para validar seus interesses. O que o Bispo fez, foi o que qualquer membro da igreja teria de fazer, fazer valer sua doutrina e suas leis. Dramas pessoais à parte, achei a situação toda muito válida, pois permite uma postura idade média por parte da igreja, era da qual ela nunca saiu, apesar da pose de moderninha em alguns casos. E se depois desta os ‘meio-católicos’ perceberem que melhor não sê-lo e resolverem sua vida religiosa fora do catolicismo, ou de qualquer outra igreja, melhor. E preparem-se todos, já já excomungarão gays e simpatizantes.
Taí uma verdade. Mas ainda assim a hipocrisia me incomoda porque mesmo na estrutura da igreja as cabeças mais cristãs acabam sendo as mais “meio-católicas”. E aí, como é que fica?
Aliás, isso não é privilégio do catolicismo. As igrejas neo-pentecostais que o digam, com seu terrorismo evangélico.
Em tempo (e comentando o que você escreveu no blog do Rex), não acho errado as pessoas quererem que a Igreja Católica (ou qualquer outra) saia da era das trevas. A mentalidade das pessoas muda, tudo se transofrma. Eu sei, isso é bem difícil de acontecer, ainda mais quando, em se trantando de religião, as coisas muitas vezes são apresentadas como valores absolutos. Mas se as leis de um país (que expressam o desenvolvimento de um povo) se mostram anacrônicas, o que se faz? Abandonamos o país e mudamos todos pra outro?
+
Há quanto tempo, hein, Sérgio? :)
Gui, saudades.
Concordo com o Sérgio. Principalmente na “E se depois desta os ‘meio-católicos’ perceberem que melhor não sê-lo e resolverem sua vida religiosa fora do catolicismo, ou de qualquer outra igreja, melhor.” Pois se as pessoas continuam lá, mesmo não concordando com tudo, fica parecendo que eles sempre têm apoio.
E quanto a sua questão, é simples. Quando as leis não estão boas, escolhemos melhores os políticos, vamos para a rua mostrar no descontetamento… O que torna tudo pior, é quando a igreja e o estado se confundem. A igreja querendo impor sua vontade a um estado que é laico e o estado cedendo à igreja, quando deveria governar – inclusive – para aqueles que nem religião tem.
Pois é, muito tempo, mas voltei a escrever e a frequentar bons ambientes na web. ;)
Os países são instituições com uma dinâmica diferente, que permitem mudanças e ajustes, já que é feito pela e da população. Eu não vejo as igrejas assim, igrejas sempre se colocaram como absolutas e assim é, “não se pode mudar a palavra e os ensinamentos de Deus”, enfim, que se religuem à essência do universo (Deus, se preferir), sem ter de passar pelo guichê da igreja para comprar o ticket.
Abração.