“Estou às margens do que parece ser um lago. Mas não é um lago comum, não é plano, é curvo como a secção de uma esfera saindo da terra. Não sei por que dou um passo adiante e entro em suas águas. Elas são limpas, claras e perfeitamente transparentes, mas não alcanço o fundo nem me parece possível mergulhar. Só é possível ficar na superfície e esta não é perturbada. Por mais que eu nade, permanece perfeitamente curva e lisa. Vou nadando e subindo até chegar ao topo do lago. E lá olho para o seu fundo. Um olho. O lago é um olho e estou nadando bem no meio de sua córnea! No fundo vejo a íris, a pupila contraída contra a luz do sol. Suas profundezas abissais protegidas da luz do dia. Mas o seu fundo sem fundo ma atrai e ali, bem no topo e no meio, posso mergulhar. Mergulho. O ar estranhamente não falta, mas quando estou a meio caminho, noto uma ondulação e um movimento na superfície. As pálpebras estão se fechando com uma onda na frente de cada uma. Observo. As matas ciliares são, de fato, cílios. A luz diminui lentamente até que elas se encontram, mas não se faz escuridão, apenas uma penumbra profunda através de um olho fechado. O suficiente para que eu enxergue meu caminho. Para dentro e para o fundo. A íris agora descansa, relaxa, liberta e se abre… Escuridão. Segura e aconchegante escuridão. Avanço. Ultrapasso. Não existe mais fundo, topo ou superfície, apenas escuridão. Não! Existe luz! Acostumado ao negrume vejo pontos de luz cintilante. Minúsculos, distantes, esparsos e inalcançáveis. Gradualmente eles se multiplicam, cintilam, oscilam e se desprendem da profundeza segura, flutuando soltos por toda a imensidão. Para o meu espanto alguns começam a se aproximar lentamente. Começam a crescer e tomar formas etéreas, diáfanas, mas inegavelmente humanas. Levezas personalizadas e desconhecidas que emitem uma luminiscência sutil. Iluminescência. Estou dentro do meu olho e fico a olhar aquele meu universo noturno que tenta delicadamente me iluminar sem muito enteder sua linguagem não verbal. Até que acordo, me desligo do meu sonho não dormido.”
Nunca, nunquinha eu vi meu inconsciente berrar assim comigo em plena luz do dia. Eu não sei onde foi que você tocou, mulher, mas foi uma chave das boas! E uma riqueza de detalhes, uma perfeição de imagem de fazer inveja a qualquer Spielberg da vida. E eu acordado… onde será que tava meu ego (super-ego?) em uma hora dessas?
Não sei se vou sonhar, se preciso sonhar, mas não tenho dúvidas quanto a uma coisa: tem alguém que precisa fechar os olhos para poder ver. A verdade não está lá fora, não. Tá aqui dentro.
Pra você, Ursinho, o último parágrafo de um texto escrito pela Doreen Valiente:
“E a ti, que buscas me conhecer, eu digo: tu busca e teu anseio de nada te servirão sem o conhecimento do mistério de que se aquilo p que procuras não encontrares dentro de ti mesmo, jamais o encontrarás fora de ti. Pois, vê, sempre estive contigo – desde o começo – e sou aquilo o que se alcança além do desejo.”
Se vc quiser, depois te mando o texto todo por mail, ok?
beijo
Quero sim! Pó mandá! :)