O Machado de Xangô
Eu tô passado até agora com essa história. É muito sinal, é muita metafísica — por falar em metafísica — pra uma pessoa só.
Há semanas atrás, com certeza há bem mais de um mês, eu cheguei de Campinas aqui em casa, descarreguei minhas tranqueiras e joguei minha bolsa em cima da cômoda da sala. Na mesma hora eu vi um machadinho de madeira, um Machado de Xangô, ali em cima. Pra quem não sabe — eu mesmo pouco sei —, dentre os orixás, Xangô é o rei, o senhor da justiça, da verdade e o machado de duas lâminas é o seu símbolo. Na mesma hora em que eu fui pegar o machadinho, parei o gesto no meio e pensei: “não é meu, de quem será?” achei que fosse da minha irmã, que tivesse ganhado na capoeria, e esqueci de perguntar. E não peguei.
Pois bem, por várias vezes até hoje eu vi esse machadinho pela sala e não peguei. Ninguém jogou fora, ele não sumiu, não se perdeu e tava sempre ali na minha frente. Eu sabia que era um machado de Xangô porque, há vários meses atrás, Ber ganhou um numa festa de Xangô e eu o vi na casa dele. Quem viu o machado hoje e, espantado, pensou “o que você tá fazendo aqui?” foi ele próprio. Quando ele perguntou de quem era eu arregalei os olhos. Perguntei, enfim, de onde tinha vindo aquele machado. Ninguém sabia. Quando preguntei pro meu pai ele disse ter quase certeza de ter tirado de dentro do carro. Ou seja, meu pai trouxe o machado pra dentro de casa.
Ber explicou que, num impulso, tinha dado o machado pra Teca pra que ele a ajudasse a resolver seus problemas, e disse: “quando você resolver seus problemas me devolva, ou dê pra quem estiver precisando.”
Teca não me deu o machado, mas esteve comigo durante o semestre inteiro, andamos muito no carro, conversamos muito, nos apoiamos e ela sabe de todas as minhas vicissitudes. Só hoje, quando tudo isso aconteceu é que eu peguei o machado nas mãos. Ber fez da mesma forma: “… resolva seus problemas…”.
O curioso é que ainda ontem, de noite, quando eu e Ber voltávamos pra casa, decidi que não dava mais pra adiar. Faz tempo que eu quero jogar os búzios, ouvir o que Mãe Dango tem pra me dizer, conhecer as minhas energias, saber quais são os meus orixás. Marcamos de ver isso quando ele voltar.
E eu tô aqui, olhando pro símbolo de Xangô, pensando na vida, arrepiado com toda essa confluência de energia. É muito sinal! Que coisa! Por onde eu começo?
Meu Pai, como é que o senhor chegou aqui?